18 de agosto de 2010

EM NOME DO PAI


Por: Marta Dalla Torre

Valéria Codato A. Silva

Todos reconhecem a díade mãe-bebê como a relação primordial na vida de qualquer ser humano, levando-se em consideração que a criança humana nasce prematura e inacabada, necessitando, portanto, dos cuidados de outra pessoa para sobreviver e, em particular, da mãe. A mãe é aquela que acolhe o bebê desde seu nascimento, e até mesmo antes, ao habitar seu mundo imaginário, oferecendo a ele um lugar a ser ocupado em seu desejo. Através dos cuidados essenciais, a mãe que nutre e protege seu bebê, acima de tudo investe de afetos sua relação com o mesmo e estabelece com ele uma relação exclusiva e excludente que é tão necessária quanto sua ruptura. Através da alternância presença / ausência da mãe, a criança poderá pouco a pouco se diferenciar e separar - se da mesma em busca de sua própria identidade, e isso só será possível quando a mãe alimenta outros desejos e interesses para além de seu bebê. Portanto, é somente a mãe quem poderá transmitir um lugar terceiro entre ela e a criança, e que será ocupado, geralmente, pela presença do pai – um homem para o qual seu desejo de mulher se vê endereçado.

Então, o pai é aquele que “salva” o filho de uma relação dual, indiferenciada e mortífera, na medida em que separando - o da mãe (ao fazer dela sua mulher), o possibilita ingressar no mundo da linguagem, do simbólico, da cultura.

Torna-se desta forma, imprescindível que o pai e a mãe não abdiquem de seu lugar de homem e de mulher para que a transmissão da lei seja possível.

A figura do pai não pode se reduzir a um mero reprodutor biológico, ou como um mantenedor econômico de sua prole. Um pai não pode ser somente “pai-de-nome”. Sua palavra deve registrar uma autoridade, uma lei a preservar a saúde mental dos filhos. Portanto é “em Nome do Pai” que a criança deve abdicar de seu lugar supostamente de plenitude e completude junto à mãe para “des-colar” desta e “decolar” rumo ao social.

Mas, o que temos presenciado nesse contexto pós-moderno em que vivemos?

Diante das mudanças sócio-culturais ocorridas nas ultimas décadas e principalmente desde que a mulher saiu do mundo privado rumo ao público, deixando o ambiente doméstico em busca de outras realizações pessoais e profissionais, os papéis feminino e masculino no contexto da família sofreram alterações. Produziu-se uma mudança radical na maneira de se educar e de se relacionar com os filhos.

Por um lado, houve uma maior aproximação entre as gerações, sendo muito freqüente hoje observarmos pais e filhos fazendo programas em comum, como por exemplo: brincar no play-center, disputar jogos de computadores ou até mesmo soltando pipas e jogando bola juntos. Também é muito freqüente pais exercendo a função de “paternagem” quando se dispõem a auxiliar nos cuidados básicos com a criança (por exemplo trocar fraldas, alimentar, dar banho, etc.)

No entanto, o pai não deve se restringir a executar tais tarefas, nem mesmo se colocar numa posição “semelhante” em relação ao filho, o que conseqüentemente o faz “irmão de seus próprios filhos”.

O mais sério e agravante no momento atual é que à mulher é atribuído um poder incomensurável, o qual reduz a figura paterna a uma presença “dispensável”, quando não incômoda. As produções independentes (tão comuns entre atrizes globais) estão cada vez mais freqüentes.

O que dizer então das atuais possibilidades de concepção do ser humano, diversas da tão conhecida “Relação Sexual”? As manipulações científicas mais recentes na fecundação até mesmo excluem a célula masculina, o que possibilitaria a uma mulher se tornar mãe sem a presença ou menção a um pai, nem mesmo que fosse ele um mero doador anônimo.

Essas mudanças nos papéis masculino e feminino e por conseguinte de maternidade e de paternidade, os insere numa nova cena, na qual a ideologia se resume em consumir e acumular bens, o que não é sem conseqüências, já que seus sinais estão bem evidentes nas novas formas de sofrimento psíquico.

Estes reflexos estão também explícitos no social, onde o declínio do Nome-do-Pai, e a conseqüente indulgência às leis produz uma sociedade órfã. A ausência dessa referência terceira gera alternativas protéticas de organização social nas formações grupais ou bandos delinqüentes, ou ainda numa espécie de apelo à lei detentora nos atos homicidas tão freqüentes em escolas ou lugares públicos.

Não há como dispensar os inúmeros benefícios dos avanços da ciência e tecnologia, nem como retroceder aos velhos moldes da família, abdicando-se das conquistas femininas. Apesar do fascínio deste “Admirável Mundo Novo”, cabe a cada sujeito construtor de sua história e por conseguinte de sua comunidade, uma reflexão sobre o seu posicionamento frente a esta realidade.

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